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 STUDIO SINM - A arte da comunicação


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TEORIA DA COMUNICAÇÃO


1. A Comunicação
O conceito de comunicação recebeu, ao longo do século XX, tantas
definições que não é possível dar início aos estudos das teorias
da comunicação sem perscrutar seu significado. A comunicação é uma
semiose, um processo signo com graus de complexidade e formas
2
variadas de realização. O conceito é amplo e pode extrapolar a
esfera do humano. Não obstante é da comunicação humana que
tratamos quando iniciamos nossos estudos sobre as Teorias da
Comunicação. Sob o ponto de vista da semiótica, poderíamos dizer
que um processo comunicativo ocorre quando um emissor elabora um
objeto, que será representado por um signo, capaz de gerar um
interpretante na mente do receptor (interprete).
E seria interessante lembrar que ele elabora um objeto de
comunicação, e que este “objeto de uma semiose” será representado
por algum meio e, de alguma forma e, finalmente, deverá gerar um
processo interpretante na mente de um interprete. A concepção
semiótica da comunicação é indicada para um início de abordagem do
fenômeno já que não seria exagero considerar a semiótica como uma
espécie de “microfísica” da comunicação.
Não obstante a pertinência de se iniciar a conceituação da
comunicação com auxílio nas teorias semióticas, tal perspectiva
não deve excluir a compreensão do âmbito sócio-cultural da
comunicação. A abordagem deve se deslocar, aos poucos, da análise
da microestrutura da comunicação, rumo a uma compreensão das
macroestruturas contextuais.
O próprio Peirce, autor do método que pode ser considerado uma das
maneiras mais formalistas e micro-estruturais de abordagem dos
fenômenos comunicativos, postulava três níveis de significado da
palavra, sendo o último capaz de afetar os rumos da sociedade.
Uma palavra possui um significado, para nós, na medida em que
somos capazes de utilizá-la para comunicar nosso conhecimento a
outros, e na medida em que somos capazes de apreender o
conhecimento que os outros procuram comunicar-nos. Este é o grau
mais baixo do significado. O significado de uma palavra é, de
forma mais completa, a soma total de todas as predições
condicionais pelas quais a pessoa que a utiliza pretende tornar-se
3
responsável ou pretende negar. Essa intenção consciente ou quase
consciente no uso da palavra é seu segundo grau de significado.
Mas, além das conseqüências com as quais conscientemente se
compromete a pessoa que aceita uma palavra, há um amplo oceano de
conseqüências imprevistas às quais a aceitação da palavra está
destinada, não apenas conseqüências de conhecimento mas, talvez,
revoluções na sociedade. Nunca se pode dizer qual o poder que pode
haver numa palavra ou numa frase, para mudar a face do mundo; e a
soma destas conseqüências perfazem o terceiro grau do significado
(PEIRCE, 1990, p. 159 - 160).
Para Francisco Antônio e Pedro Dória, em Comunicação: dos
fundamentos à internet “Comunicação é o estudo das relações entre
a cultura e os meios de comunicação de massa”. Surge aí, em
relação à concepção semiótica, não só o lugar da cultura nos
processos de comunicação, como também um recorte, que volta as
atenções para aquilo que realmente é estudado, no âmbito
acadêmico, como sendo comunicação: a comunicação de massa.
Impacientes com a complexas considerações de cultura de Bronislaw
Malinowiski, estes dois autores recorrem a uma definição
funcionalista de cultura, onde a cultura é definida como objeto de
estudo da antropologia cultural e “estuda os sistemas simbólicos
produzidos, transmitidos e reproduzidos pelo homem fora da
reprodução física da espécie”. Mas, para os propósitos deste
curso, será muito mais interessante recorrer ao conceito de
cultura proposto por Edgar Morin em Cultura de Massas no século
XX: o espírito do tempo, neurose:
Podemos adiantar que uma cultura constitui um corpo complexo
de normas, símbolos, mitos e imagens que penetram o
indivíduo em sua intimidade, estruturam os instintos,
orientam as emoções. Esta penetração se efetua segundo
trocas mentais de projeção e de identificação polarizadas
nos símbolos, mitos e imagens da cultura como nas
personalidades míticas ou reais que encarnam os valores (os
4
ancestrais, os heróis, os deuses). Uma cultura fornece
pontos de apoio imaginários à vida prática, pontos de apoio
práticos à vida imaginária; ela alimenta o ser semi-real,
semi imaginário, que cada um secreta no interior de si (sua
alma), o ser semi-real, semi-imaginário que cada um secreta
no exterior de si no qual se envolve (sua personalidade)
(MORIN, 1967, p. 17).
1.1. O Significado do Termo nos Dicionários
Dentre as várias definições de comunicação que encontramos no
dicionário Aurélio, destacamos as seguintes:
· Ato ou efeito de comunicar (-se).
· Ato ou efeito de emitir, transmitir e receber
mensagens por meio de métodos e/ou processos
convencionados, quer através da linguagem falada ou
escrita, quer de outros sinais, signos ou símbolos, quer
de aparelhamento técnico especializado, sonoro e/ou
visual.
· Por extensão: A ação de utilizar os meios necessários
para realizar tal comunicação.
1.2. A Comunicação é uma ciência?
Mas o que é a comunicação no universo acadêmico, uma ciência? Na
verdade, a comunicação está bem mais próxima de ser um objeto, ou
melhor ainda, um campo de estudo conforme coloca Francisco
Rudiger
A comunicação não é uma ciência mas um campo de
estudo multidisciplinar, cujos métodos de análise não têm
qualquer especificidade, foram desenvolvidos pelos diversos
ramos do conhecimento filosófico, histórico ou sociológico.
O conceito do mesmo não dispõe de autonomia teórica, deve
5
ser pesquisado no quadro das teorias da sociedade (Rudiger,
p. 17).
1.3. A Etimologia do Termo
Luis Martino propõe a seguinte etimologia do termo comunicação: O
termo comunicação vem do latim communicatio, do qual três
elementos são destacados:
uma raiz munis = "estar encarregado de"
prefixo co = “reunião”
terminação tio = “atividade”
Significado = "atividade realizada conjuntamente"
2. Conceitos Fundamentais
O conceito de comunicação nos leva, quase que diretamente, a determinados
termos. Alguns deles são operacionais e de grande utilidade quando se tem
pela frente o objetivo de aprofundar conhecimentos sobre este campo do
conhecimento.
2.2. Código - Mensagem
· O código, em teorias da comunicação, pode ser definido como sendo
um “Conjunto de regras por meio do qual mensagens são convertidas,
de maneira convencionada e reversível, de uma representação para
outra” (Dicionário Aurélio).
· A mensagem, por sua vez, nas teorias da informação figura como uma
“Estrutura organizada de sinais que serve de suporte à
comunicação; o enunciado considerado apenas ao nível do plano de
expressão, com exclusão dos conteúdos investidos” (Dicionário
Aurélio)
Sobre esta dicotomia Código-Mensagem, é interessante ainda
observar que trata-se de uma reformulação semiótica da dicotomia
lingüística de língua e fala (NÖTH, 1996, p. 114). Seguindo esta
observação de Winfried Nöth, podemos ver o código como um fenômeno
6
sincrônico (estado de linguagem considerado em seu funcionamento
num momento dado do tempo), como um sistema de signos (que podem
ser lingüísticos ou não), enquanto as mensagens figuram como
entidades diacrônicas, não sistematizadas que se modificam ao
longo do tempo.
2.3. Signo
A diversidade de significados do conceito de signo não é muito
inferior à do conceito de comunicação. Nos dicionários normalmente
é referido como sinônimo de sinal e de símbolo, ou como uma
entidade capaz de representar, de significar.
Na extensa obra de Charles Sanders Peirce, pai da ciência dos
signos (semiótica), figuram diversas e complexas definições de
signo. Mas justamente por estar consciente da dificuldade de
comunicação provocada pela complexidade de suas teorias, Peirce
cunhou uma definição mais simples de signo:
Um signo, ou representamen, é aquilo que, sob certo
aspecto ou modo, representa algo para alguém. Dirige-se a
alguém, isto é, cria na mente dessa pessoa um signo
equivalente, ou, talvez, um signo mais desenvolvido. Ao
signo assim criado, denomino interpretante do primeiro
signo. O signo representa alguma coisa, seu objeto.
Representa esse objeto não em todos os seus aspectos, mas
com referência a um tipo de idéia que eu, por vezes,
denominei fundamento do representamen. (PEIRCE, 1990,
p.46) [sem grifo no original]
Já para uma outra grande tradição, a semiologia de extração
Saussureana, o signo é “uma entidade psíquica de duas faces”
(SAUSSURE, 1969, p. 80) que consiste de um conceito (o
significado) e uma imagem acústica, o significante. Mas esta
7
imagem acústica não é o som, no sentido físico, mas a impressão
psíquica deste som.
Na semiótica de Peirce, a sua classificação dos signos leva em
conta três formas básicas de significação: a significação por
semelhança, por contigüidade e por convenção. Saussure, no Curso
Geral de Lingüística, levou em conta apenas os processos sígnicos
por convenção, mesmo fora da linguagem verbal. Contudo, na
tradição de extração saussureana, Roman Jackbson propõe a
dicotomia metáfora-metonímia, fundamentada na oposição entre
semelhança e contigüidade.
2.4. Texto
As definições de texto são inúmeras e variam conforme a tradição.
As diversas teorias lingüísticas, as semiologias e semióticas, a
tradição dos Estudos Culturais e as teorias da Análise do
discurso, dentre outras tradições, oferecem, cada uma, a sua
definição de texto.
Mas a noção de texto tem um brilho especial na teoria do grande
pensador russo Mikhail Bakhtin. Isto se deve ao fato de que quando
suas idéias foram descobertas, em meados dos anos sessenta,
estudiosos de toda parte do mundo não puderam entender como,
tantos anos antes (final da década de 20) ele já teria postulado e
desenvolvido teses que a lingüística ocidental somente veio a
conhecer tanto tempo depois.
Outro aspecto interessante na concepção Bakhtiniana de texto,
especialmente para o estudante de comunicação, é que, para
Bakhtin, o texto é o objeto por excelência das ciências humanas.
Pois o texto, diferentemente do “objeto” das ciências exatas, se
movimenta e nunca é o mesmo, a cada instante do processo
enunciativo. Esta concepção do texto, que é um objeto de
comunicação, como objeto das ciências humanas parece fechar um
8
ciclo juntamente com a idéia de que a comunicação não é uma
ciência, mas sim um objeto. Para Bakhtin não há comunicação sem
texto, e também não texto que se dê fora de um processo
comunicativo. As reflexões de Bakhtin não apenas trazem as
questões da comunicação para dentro da lingüística, como também
colocam a comunicação em uma posição epistemologicamente
privilegiada.
2.4.1 – O tema: “sentido da enunciação completa”1
Para Bakhtin, a lingüística tradicional, afetada por uma nostalgia
das línguas mortas, não vê estes elementos não verbais que tornam
os abstratos elementos da langue2 vivos. A língua, dentro da
tradição saussureana, é vista como um sistema monológico, onde a
intertextualidade dialógica, advinda da natureza viva da língua em
seu contexto concreto, é excluída. Isto quer dizer que a
comunicação, tal como acontece entre dois interlocutores, em seu
momento vivo, em seu desenrolar no tempo, não era valorizada no
sistema de Saussure. De acordo com esta tradição o enunciado seria
composto apenas pelos elementos da lague, pela estrutura sígnica
do discurso. Mas para Bakthin, os elementos não verbais do
enunciado são concretos tal qual o instante histórico em que se
inserem. A cada vez a que a expressão “Que horas são” é enunciada,
o seu sentido muda, muda o seu “tema”. O tema para Bakhtin é o
sentido da enunciação completa e “depende da situação concreta
(histórica, numa escala microscópica) em que é pronunciada [a
enunciação] e da qual constitui na verdade um elemento”.
Inseparável do sistema de signos estáticos que o “objetivismo
abstrato” (tradição saussureana) chama de Langue,
1 BAKHTIN, Mikhail; Volochinov. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo:
Ucitec, 1992. p 128.
2 De acordo com o pai da lingüística moderna, A langue é uma realidade psíquica de
significados e imagens acústicas; “constitui-se num sistemas de signos, onde, de
essencial, só existe a união do sentido e da imagem acústica, onde as duas partes
do signo são igualmente psíquicas” (SAUSSURE, 1969, p. 23)
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O tema é um sistema de signos dinâmico e complexo, que
procura adaptar-se adequadamente às condições de um dado
momento da evolução. O tema é uma reação da consciência em
devir ao ser em devir. A significação é um aparato técnico
para a realização do tema. Não há tema sem significação e
vice-versa. Além disso, é impossível designar a
significação de uma palavra isolada (por exemplo, no
processo de ensinar uma língua estrangeira) sem fazer dela
o elemento de um tema, isto é, sem construir uma
enunciação, um ‘exemplo’.”
Mas a fixidez do sistema de signos da langue não pode ser
desprezada. É justamente a estabilidade relativa propiciada por
este sistema que irá permitir ao tema ter o seu sentido, o seu
“elo com o que o precede e o que o segue” (BAKHTIN, 1992, p 128).
Portanto, é essa estabilidade que garante que a comunicação
aconteça.
Além desta crítica materialista que Bakhtin faz ao psicologismo
saussureano, ele não deixará de condenar também o princípio da
causalidade, usado por certos marxismos, para explicar como a
“infra-estrutura” determina a ideologia (conhecimento científico,
literatura, religião, moral etc). O mundo dos signos não poderia
figurar como uma “superestrutura” determinada de forma causal pela
infra-estrutura econômica. Os signos e a ideologia são
constituintes desta realidade concreta que, no marxismo mais
positivista, ficava restrita à esfera da “infra-estrutura”. Os
signos são vistos pela translingüística Bakhtiniana como produto
do diálogo que, por sua vez, se dá em determinado contexto
extraverbal concreto que é interno ao texto dialógico, seu
constituinte.
2.5 - Polissemia
10
A multiplicidade de significados que cada signo pode assumir é uma
das características mais exploradas pela propaganda, portando é
de grande importância a compreensão do significado e da natureza
da polissemia para o entendimento das teorias das semióticas e
semiologias, bem como para a compreensão das teorias da
comunicação como um todo.
Peirce dizia que um signo representa seu objeto sob certo aspecto
ou modo. Teríamos aí então uma redução de significados, pois
apenas alguns aspectos do objeto seriam transmitidos na semiose
(processo de significação) . Mas acontece que cada signo é
passível de ser interpretado por diversas perspectivas,
O que Peirce descreve não são classes
aristotélicas de signos. Por isso, um mesmo
signo pode ser considerado sob vários aspectos
e submetido a diversas classificações. (NÖTH,
1995, p. 86)
A polissemia permite o uso e o abuso da ambigüidade na propaganda.
Contudo, o desenvolvimento da Teoria Hipodérmica trouxe
desconfianças quanto à eficácia dos meios de comunicação de massa
e ao seu poder absoluto, enquanto as teorias da persuasão e dos
“efeitos limitados” perceberam que outros fatores interviam na
relação entre os emissores e os receptores. O que estava sendo
descoberto era a complexidade dos processos semióticos, inclusive
a polissemia.
2.6 - Sociedade de massas
No final do século XIX observou-se uma mudança significativa no
funcionamento das sociedades contemporâneas. Assistia-se ao fim de
um sistema tradicional estável, onde os indivíduos estavam
intimamente ligados, seja por laços de família, pela tradição de
se viver em um mesmo lugar, ou por motivos religiosos. “Uma
11
organização social assim coloca o indivíduo dentro do nexo de
sistemas extremamente sólidos de controle social informal” (DE
FLEUR-BALL-ROCKECH, 1993, p. 171). Outro modelo de sociedade vinha
se formando simultaneamente ao surgimento das reflexões mais
específicas sobre os fenômenos sociais.
As primeiras teorias sociológicas, contemporâneas das primeiras
tentativas de criação de jornais populares, concebiam a sociedade
como um vasto organismo. Mas, em fins do século XIX, ficou claro
que esta organização se tornava cada vez mais complexa. Para as
teorias sociológicas deste período, independente das divergência
entre as várias, tendências, a “massa” era formada por um conjunto
homogêneo de indivíduos, isolados entre si, desprovido dos
vínculos tradicionais que antes uniam as pessoas. A massa era
assim concebida, indiferentemente de suas origens e dos grupos
sociais a que pertenciam. Tal concepção de sociedade vai conduzir,
ao lado da psicologia behaviorista, as diretrizes da Teoria
Hipodérmica.
3 - O Surgimento das Pesquisas da Comunicação de Massas
No início do século XX, a eclosão das comunicações de massa,
dentre outros fatores, prepararam o surgimento das Pesquisas da
Comunicação de massas. Em 1927 Harold D. Lassswel (1902 – 1978)
publica Propaganda Techniques in the World War. A guerra traz
novas necessidades aos mecanismos de manipulação dos governos
envolvidos.Se antes o “povo” de uma nação se encontrava unido por
vínculos mais tradicionais ao sentimento de nacionalidade, na
sociedade de massas isto não aconteceia. Os compromissos assumidos
pelas nações envolvidas no grande conflito fez com que os governos
recorressem ao uso de novos recursos no objetivo de estimular os
vínculos existentes entre os indivíduos e a sociedade: “Tornou-se
essencial mobilizar sentimentos e lealdades, instalar nos cidadãos
ódio e medo contra o inimigo, manter elevado seu moral diante das
12
privações e captar-lhes energias em uma efetiva contribuição para
sua nação” (DE FLEUR-BALL-ROCKECH, 1993, p. 179).
sua ligação com os regimes totalitários que se instalaram na
sociedade ocidental nas primeiras décadas do século vinte. Tanto
Hitler na Alemanha, quanto Mussolini na Itália e Stalin na França,
se valiam dos meios de comunicação de massa na manipulação de seu
povo. Outro fator decisivo para o surgimento desta tradição de
pesquisa é a novidade de uma guerra global.
Mas em uma sociedade onde o isolamento do individuo na massa
anônima permite cada vez menos as relações com sentimentos
aglutinadores e sólidos, atingir tal objetivo era uma tarefa
impossível, a menos que se recorresse a outros mecanismos capazes
de suprir tais ausências. O mecanismo encontrado para cumprir tal
tarefa foi a propaganda. As populações das nações envolvidas
foram então “bombardeadas” por uma avalanche de mensagens
veiculadas por fotografias, filmes, discos, discursos, livros,
sermões, cartazes, noticiários telegráficos, boatos, avisos em
murais e panfletos, que visavam persuadir os cidadãos sobre a
necessidade e a importância da guerra.
4 - O modelo de Larswell
Harold Lasswel elabora um novo modelo, que aponta os
rumos alternativos para a communication research. Partindo
de um paradigma usado em sociologia (“quem obtém o quê?
quando? de que forma?”), Lasswell apresenta, em 1948, o
seguinte esquema:
Quem Þ Diz o quê Þ Através de que Canal Þ
Com que efeito
13
“Quem” corresponde ao emissor da mensagem; “diz o que”
refere-se à própria mensagem; “através de que canal”
refere-se ao meio utilizado na transmissão da mensagem;
“com que efeito” refere-se aos fatores ligados à
audiência, ou seja, aos receptores da mensagem emitida.
14
5 - A Teoria Hipodérmica
Segundo uma citação de Wrigth (apud WOLF, 1999), as teses da
teoria hipodérmica podem ser sintetizadas na afirmação de que
“cada elemento do público é pessoal e diretamente ‘atingido’ pela
mensagem”. Os teóricos desta tradição acreditavam que a massa
(conjunto de indivíduos isolados e uniformizados) seria direta e
fatalmente atingida pelas mensagens emitidas pelos novos meios de
comunicação, assim como uma bala atinge o seu alvo.
Qual seria o efeito da ação dos mass media em nas sociedades do
início do século XX? De que forma estes meios veiculariam as
mensagens desejadas, de que forma provocariam o esperado efeito?
Os autores da teoria Hipodérmica acreditavam que os meios de
comunicação de massas teriam a capacidade moldar a opinião pública
possibilitando uma manipulação das massas. O modelo comunicativo
da teoria Hipodérmica consiste em uma aplicação direta da
conhecida forma comportamentalista (behaviorista) onde a cada
estímulo deve corresponder uma resposta. Independentemente dos
meios usados, e do perfil do público atingido, a cada estímulo,
transmitido via meios de comunicação de massas, deveria
corresponder uma resposta, a aceitação das mensagens pelas
audiências. Pois se era verdade que a massa era desprovida de
particularidade, que ela encarnava a uniformização dos indivíduos,
não haveria porque imaginar que uma única mensagem não funcionaria
igualmente para todos os indivíduos atingidos por ela. Os efeitos
sobre a audiência seriam então imediatos, uniformes e diretos,
como a perfuração da pele por uma agulha hipodérmica ou por uma
Diz o quê
=
Mensagem
Quem
=
Emissor
Através de que
canal
=
Meio
Com que efeito
=
Receptor -
Audiência
Þ
Þ
Þ
15
bala de uma arma de fogo; daí um outro nome pelo qual a teoria
Hipodérmica é conhecida: Bullet Theory.
Estímulo Þ Resposta
6 - A abordagem Empírico-Experimental ou Teoria da Persuasão
As pesquisas empírico-psicológicas surgem no período
áureo da teoria hipodérmica, justamente quando alguns de
seus pressupostos entram em crise. As teorias da persuasão
dão continuidade ao procedimento de “selecionar alguns
indicadores e procedimentos para se compreender a forma de
agir da audiência enquanto consumidor”. Entretanto, a
crença na natureza indiferenciada do consumo das mensagens
entra em crise. O trabalho empírico, a observação da
audiência e as inúmeras pesquisas realizadas indicavam que
o público não era indiferenciado.
O esquema básico “estímulo-resposta” desenvolve-se.
Enquanto nos pressupostos da “teoria da bala” o indivíduo
responde aos estímulos dos meios de comunicação de massa
sem oferecer resistência, nas teorias da persuasão são
consideradas algumas condições psicológicas que intervêm
no processo comunicativo.
pressupor uma correspondência perfeita entre a
natureza e a quantidade do material apresentado
numa campanha informativa e a sua absorção por
parte do público, é uma perspectiva ingênua,
porque a natureza real e o grau de exposição do
público ao material informativo são, em grande
parte, determinados por certas características
psicológicas da própria audiência. (HYMAN,
SHEASTLEY apud WOLF, 1999, p.36.)
Para as teorias da abordagem da persuasão, a mensagem
deve ser adequada à reação psíquica do destinatário. Os
componentes e a estruturação da mensagem devem ir ao
encontro das predisposições psíquicas da audiência.
Os fatores que intervêm no sistema “estímulo Þ
resposta” podem ser divididos em dois grandes grupos: o
dos fatores ligados à audiência e o dos fatores ligados à
mensagem.
16
5.1 - Os fatores ligados à audiência
Os receptores devem estar em condições tais que possam
ser afetados pelas mensagens. Algumas condições
psicológicas da audiência são determinantes para a
recepção ótima da mensagem. Se parte da audiência não
possui informações sobre o que é veiculado pelas
mensagens, é grande a probabilidade de não sucesso do
processo persuasivo. O interesse em obter informação
(interesse em obter informação), a predisposição a se
expor à informação (exposição seletiva), a alteração das
mensagens pela interpretação do receptor (percepção
seletiva) e a alteração das mensagens ao longo do processo
de memorização são os principais fatores ligados à
audiência (WOLF, 1999 pp. 36-42).
5.1.1 - Interesse em obter informação
Pessoas que já foram expostas ao assunto da campanha
terão maior interesse pela mesma e, conseqüentemente,
demonstrarão maior motivação para saber mais acerca do
assunto.
5.1.2 – Exposição seletiva
Os receptores tendem a se expor às informações que
estão em conformidade com as suas atitudes e, por outro
lado, tendem a evitar conteúdos que vão de encontro às
suas predisposições e aos seus pontos de vista.
5.1.3 – Percepção seletiva
O termo percepção é usado para se enfatizar que o
processo perceptivo envolve também a interpretação dos
estímulos, das mensagens. Segundo esse princípio, os
receptores tendem a alterar os significados das mensagens
durante o processo de interpretação, de acordo com
determinados aspectos da sua personalidade. Um membro da
audiência pode inclusive “fugir da questão”, alegando “não
compreender” a mensagem – é o que se denomina
“decodificação aberrante”. Pode ocorrer também que o
receptor aceite apenas parcialmente a mensagem.
5.1.3.1 - Os efeitos de assimilação ou contraste
Existe uma maior disposição à aceitação da mensagem
quando as opiniões expressas assemelham-se às concepções
do receptor. O emissor que pretende persuadir a audiência
preocupa-se, em alguma medida, com a perspectiva do
destinatário. Quando a distância entre o conteúdo da
mensagem e as concepções do receptor é pequena, não existe
um contraste entre os dois pólos da comunicação, ocorrendo
uma boa assimilação.
Para Mauro Wolf, entretanto, outros fatores atuam
nesse processo:
17
a) uma diferenciação não excessiva entre as opiniões
do indivíduo e as do emissor;
b) um escasso envolvimento e uma fraca adesão do
destinatário ao assunto da mensagem e as suas
idéias a respeito desse assunto;
c) uma atitude positiva em relação ao comunicador.
Esses três requisitos compõem um “campo de aceitação”
que fornece parâmetros para se saber em que medida as
opiniões contidas na mensagem encontram uma aceitação pelo
receptor, ou seja, em que medida elas são consideradas
“objetivas” e “aceitáveis”.
Em oposição ao “campo de aceitação”, existe um campo
de recusa, constituído por condições opostas às que foram
citadas acima.
Um exemplo interessante de preocupação do emissor com
uma boa assimilação e com ama diminuição dos contrastes é
fornecido pela letra de uma canção de Geraldo Vandré.
Em A desinvenção do som: leituras dialógicas do
tropicalismo, Paulo Eduardo Lopes analisa várias “canções
de protesto” brasileiras da década de 1970. Na letra da
música Samba de mudar, Lopes identifica elementos comuns a
outras canções de Geraldo Vandré, observando que “[...] a
única variação está em que esta letra, diferentemente das
demais, incorpora a perspectiva do destinatário (o
“ouvinte do samba”), mostrando que a manipulação proposta
pelo destinador só será eficaz se ambos os pólos da
comunicação compartilharem o mesmo quadro de valores”. Em
uma nota, Lopes cita Algirdas Julien Greimas, que afirma
que nenhuma forma de manipulação pode ser eficaz de outro
modo. (cf. GREIMAS, A. J. Du sens, II. Paris, Seuil, 1983,
p. 219.)
Eis a letra da canção.
SAMBA DE MUDAR
Baden Powell/Geraldo Vandré

Que samba bom
É samba meu
Teu
Da nossa dor
Samba de sofrer
Samba de saber
Samba de querer
Samba de mudar
18
Só quem sofreu, quem chorou
Meu samba vai ouvir
Meu samba vai cantar
Só na tristeza e na dor
Alguém pode entender
Que a dor tem de acabar
E assim, somente quem sofreu, quem
chorou
Meu samba vai ouvir, meu samba
vai cantar
E tudo fica só...
5.1.4 - A memorização seletiva
Os elementos seletivos, acima referidos, que estão
presentes nos estágios da recepção são semelhantes aos
encontrados na etapa de memorização das mensagens. Os
aspectos da mensagem que estão de acordo com as concepções
do receptor são não apenas percebidos com maior eficiência
e freqüência, como também são memorizados com maior
facilidade. À medida que o tempo passa, o receptor mantém
as informações que para ele possuem maior importância,
informações que estão de acordo com suas concepções e com
sua formação cultural, enquanto aquelas que estão mais
distantes das suas perspectivas são mais rapidamente
esquecidas.
5.2 - Fatores ligados à mensagem
Nas teses da Teoria da Persuasão, as variáveis
relativas aos fatores ligados à audiência, acima
abordadas, também estão presentes quando as atenções da
pesquisa se voltam para os fatores ligados à mensagem.
Alguns estudos, enquadrados por Mauro Wolf na tradição da
Teoria da Persuasão, concentram esforços para compreender
os fatores ligados à mensagem.
5.2.1 - A credibilidade do comunicador (credibilidade
da fonte)
Os estudos apresentados mostraram que “mensagens com
os mesmos argumentos mas atribuídas a fontes opostas são
eficazes de modo diverso”. (WOLF,38) . Esta influência se
dá mais na interpretação imediata da informação do que na
interpretação à logo prazo.
5.2.2 - A ordem da argumentação
Uma mensagem é formada por argumentos, mesmo quando
estes são constituídos por premissas implícitas. Uma
argumentação tem sempre implícitos aspectos positivos e
aspectos negativos. O problema que se apresenta é o
19
seguinte: quais aspectos devem ser colocados no primeiro
momento da explanação (os positivos ou os negativos?) e
quais aspectos devem vir por último?
Imagine que a sua namorada, ou cônjuge, encontrou você
em uma situação inusitada em um lugar público. Nesse dia,
você teria avançado um pouco na intimidade com uma colega
de trabalho, pegando em sua mão enquanto tomavam um
cafezinho depois do almoço, em um restaurante próximo ao
local de trabalho. O acontecimento, na verdade, não teve
importância, porque você e a colega de trabalho estão
longe de ter um caso. No entanto, a sua namorada, diante
da cena, recuou e foi embora rapidamente. A questão que se
coloca é a seguinte: quando for explicar a ela o que
aconteceu, você, primeiramente:
a) argumentará que sempre foi fiel, bem comportado, e
que ela não tem razão para ficar desconfiada, porque o
que ela viu foi apenas um momento de descontração um
pouco exagerado etc.;
b) ou dirá que você realmente se excedeu um pouco, que não
deveria, de fato, ter pego na mão da colega, para somente
em seguida apresentar as razões positivas (listadas no
item “a”)?
5.2.3 - A Integralidade das argumentações
5.2.4 - A explicitação das conclusões
20
7 - Teoria empírica de campo ou dos “efeitos limitados”
As teorias dos efeitos limitados apresentam diferenças
quantitativas e qualitativas em relação às abordagens anteriores.
Se a teoria hipodérmica pensa os efeitos em termos de manipulação,
e se as teorias psicológico-experimentais falam de persuasão, a
teoria empírica de campo trabalha com a idéia de influência. Os
efeitos não são mais avaliados apenas em relação à esfera dos
indivíduos, sendo considerados como parte de um processo mais
complexo, que é o da influência pessoal. A influência dos mass
media percorre necessariamente o filtro das relações pessoais da
comunidade, em seu caminho até os componentes individuais da
audiência. Trata-se de uma “influência não apenas exercida pelos
mass media, mas [de] uma influência geral que ‘perpassa’ as
relações comunitárias e de que a influência das comunicações de
massa é só mais uma componente” (WOLF, 1999, p.47).
A teoria dos efeitos limitados é a primeira a operar uma
abordagem nitidamente sociológica, associando os processos de
comunicação de massa com as características do contexto social. De
acordo com Wolf, duas correntes podem ser identificadas nos
estudos dessa tradição.
7.1 - O estudo da composição dos públicos e dos modelos de consumo
dos mass media
A partir de uma pesquisa financiada pela Fundação Rockefeller,
Lazarsfeld escreve, em 1940, Radio and prited page: an
introduction to the study of radio and its role in the
communication of ideas, um trabalho que associa as características
dos destinatários às características dos seus programas
preferidos, com o objetivo de estudar os atrativos dos programas,
para descobrir os motivos que levam a audiência a ouvir um
determinado tipo de programa e não outros.
Existem três processos diferentes para saber o que um
programa significa para o público. Se possível, deveriam ser
utilizados em conjunto. (LAZARSFELD, apud WOLF, 1999, p. 48.)
a) Análise do conteúdo – considerando-se o conteúdo como um
todo, o que os ouvintes realmente absorvem, o que eles
extraem do conteúdo?
b) Características dos ouvintes - análise dos vários
grupos de ouvintes, considerando-se diferenças psicológicas
entre sexos, grupos de idade e classes sociais. A comédia
assistida por um grupo com nível elevado de conhecimento deve
ter conteúdo mais elevado que a comédia assistida por um
grupo de nível menos elevado de conhecimento.
c) Estudo sobre as satisfações – o que causa a
satisfação? Porque uma pessoa ouve um programa? Nesta
21
abordagem, pode-se passar do nível primário da mera descrição
para o nível da conceptualização.
Estudando o problema das preferências, os autores da
teoria empírica de campo concluem que a forma de
estratificação da sociedade influencia profundamente os
efeitos. O abandono da relação causal entre propaganda de
massas e manipulação promove a adoção de um processo
indireto de influência, em que as dinâmicas sociais se
intersectam com os processos comunicativos.
7.2 – O estudo da mediação social do consumo dos meios de
comunicação de massa
Ao tentar influenciar as tropas alemãs, os propagandistas
aliados perceberam que só é possível avaliar a eficiência de uma
campanha dentro do contexto social em que ela ocorre. Fica claro,
para os pesquisadores da teoria dos efeitos limitados, que os
efeitos dos meios de comunicação de massa dependem da situação
social em questão.
A principal obra sobre a mediação social do consumo dos mass media
é um trabalho de Lazarsfeld, Berelson e Gaudet, escrito em 1944,
How the voter: makes up his mind in a presidential campaing (A
opção das pessoas: como o eleitor elabora suas próprias decisões
numa campanha presidencial). A pesquisa descrita nessa obra teve
por objetivo individualizar os motivos e as modalidades pelos
quais se formaram as atitudes políticas no decorrer da campanha
presidencial de 1940, numa comunidade de Ohio (Enrie County). A
pesquisa foi organizada a partir de problemas como os papéis da
posição socioeconômica, da religião e do grupo etário na
predisposição das orientações de voto. Também foi levada em conta
a “correlação entre o grau de interesse, de motivação e de
participação na campanha eleitoral e o grau de exposição a essa
mesma campanha” (WOLF, 1999, p. 51).
A principal conseqüência da pesquisa foi a descoberta dos líderes
de opinião e do fluxo de comunicação de dois níveis.
6.2.1 - Líderes de opinião e fluxo de comunicação de dois níveis
Processos
comunicativ
os
Dinâmicas
sociais
22
Os líderes de opinião são pessoas que se destacam dos demais
membros da comunidade por terem um alto grau de conhecimento e de
interesse. Eles constituem uma parte da audiência que tem a
capacidade de influenciar os demais na formação de suas opiniões
sobre os temas veiculados pelas campanhas publicitárias. O líder
de opinião pode ser local ou cosmopolita.
Local – tendo vivido sempre na comunidade onde exerce liderança,
tem ascensão sobre os outros indivíduos mais pelo fato de conhecer
muitas pessoas, do que por possuir alguma competência específica.
Exerce influência “em diferentes áreas temáticas; é, como Merton
diz, polimorfo” (WOLF, 1999, p. 56). O líder local tem um perfil
eclético de consumidor dos meios de comunicação de massa.
Cosmopolita – monomórfico, especialista em alguma matéria, ele é
um estrangeiro na comunidade e tem a sua ascendência sobre os
outros indivíduos restrita à abrangência da sua especialidade. O
líder cosmopolita “consome gêneros mais ‘elevados’ de comunicações
de massa” (WOLF, 1999, p. 56).
Diante da constatação da importância dos lideres de opinião,
torna-se evidente o fato de que os efeitos dos mass media são
parte de um processo mais complexo, que é o da influência pessoal.
O modelo linear das teorias hipodérmica e experimental-psicológica
é quebrado – instala-se, entre o emissor e o receptor, uma outra
etapa do processo. A mensagem tem que interagir com a rede de
relações sociais da comunidade em questão.
8 – O funcionalismo
Na teoria sociológica funcionalista, os meios de comunicação de
massa figuram como um subsistema do sistema complexo que forma a
sociedade como um todo. De acordo com De Fleur, o estruturalfuncionalismo
americano está inserido em uma tradição de
pensamento em que a sociedade é abordada como um organismo – uma
estrutura fundamenta a estabilidade da sociedade. Tal perspectiva,
que remonta a Platão, tem um momento importante durante o período
de surgimento das ciências sociais. Presente no pensamento de
intelectuais como Saint-Simon (1760-1825), Auguste Conte (1798-
1857) e Herbert Spencer (1820-1903), tal concepção é levada a cabo
por Émile Durkheim, ao final do século XIX. A perspectiva da
sociedade como um sistema, em que as partes tendem a manter um
equilíbrio, está presente nas reflexões do estruturalfuncionalismo.
O comportamento familiar, as atividades econômicas, as atividades
políticas, a magia e a religião, como atividades repetitivas, são
organizadas em uma estrutura. Cada uma dessas atividades
repetitivas tem uma função na manutenção da estabilidade ou do
equilíbrio da estrutura social. As atividades repetitivas e
padronizadas constituem, portanto, subsistemas, estruturados em um
23
todo, em um sistema social. Cada subsistema cumpre a sua função se
satisfizer uma necessidade do sistema.
Vejamos, por exemplo, a questão da manutenção do esquema de
valores de uma sociedade. Suponhamos que o subsistema das
comunicações de massa reforça, em alguma medida, os modelos de
comportamento existentes no sistema social, no que se refere à
manutenção do seu esquema de valores. Nesse caso, é possível
considerar que o subsistema das comunicações de massa cumpre a sua
função na manutenção do equilíbrio do sistema.
8.1 - Os imperativos funcionais
Para a teoria estrutural-funcionalista, existe uma lógica que
regulamenta os fenômenos sociais, a qual é constituída pelas
próprias relações de funcionalidade do sistema. As relações de
funcionalidade propiciam a solução de determinados imperativos
funcionais, que são problemas que devem ser parcialmente
resolvidos para que o sistema mantenha-se estável ou em
equilíbrio. E é justamente a ação social, proveniente dos
subsistemas e dos indivíduos, estruturados em um sistema total,
que permite a satisfação das necessidades dos imperativos
funcionais.
De acordo com Wolf, os imperativos funcionais são os seguintes:
a) a manutenção do modelo e o controle das tensões – o sistema
social possui mecanismos de socialização que ativam o processo
pelo qual os modelos culturais são interiorizados na personalidade
dos indivíduos;
b) a adaptação ao ambiente – para sobreviver, cada sistema
social deve se adaptar ao seu ambiente social (um exemplo de
função que soluciona o problema da adaptação é a divisão do
trabalho, que se baseia no fato de que nenhum indivíduo poder
desempenhar simultaneamente todas as tarefas que precisam ser
realizadas para a sobrevivência do sistema social);
c) a perseguição do objetivo – cada sistema social tem vários
objetivos a alcançar, susceptíveis de ser realizados mediante
esforços de caráter cooperativo (como a defesa do próprio
território e o incremento da produção);
d) a integração – as partes que compõem o sistema devem estar
interligadas, deve existir fidelidade entre os elementos de um
sistema e fidelidade ao próprio sistema no seu conjunto. Para
contrariar as tendências desagregadoras, é necessário que haja
mecanismos que sustentem a estrutura fundamental do sistema.
A satisfação dos imperativos funcionais dependerá então de ações
realizadas pelos subsistemas. Cada subsistema é composto por todos
os aspectos da estrutura social que colaboram para a satisfação de
um dos quatro problemas funcionais fundamentais (imperativos
funcionais). Caso uma estrutura atue em sentido contrário,
impedindo a satisfação de um dos problemas funcionais
fundamentais, ela estará sendo disfuncional.
24
Também é importante observar que as funções são conseqüências
objetivas da ação, enquanto os propósitos são conseqüências
subjetivas da ação. Quando o estrutural-funcionalismo refere-se às
funções, está tratando tanto as funções quanto as ações a elas
relacionadas, assim como as conseqüências que estas desencadeiam,
como fenômenos objetivos.
Uma ação de um subsistema, ao satisfazer a necessidade de um dos
imperativos funcionais e contribuir para a manutenção do sistema
social como um todo, pode, ao mesmo tempo, atuar diretamente sobre
outros subsistemas, realizando uma função indireta. As funções
indiretas não satisfazem diretamente uma necessidade do sistema e
não atuam diretamente na resolução de um dos problemas
fundamentais (imperativos funcionais).
Se as funções são desejadas e reconhecidas, elas são consideradas
funções manifestas. Aquelas funções que, por sua vez, não são
reconhecidas nem conscientemente desejadas são consideradas
funções latentes.
Dentro dessas complexas relações, é comum que mais de um
subsistema esteja apto a resolver um dos quatro imperativos
funcionais. Existem diversas alternativas funcionais para a
resolução de cada um dos problemas fundamentais (imperativos
funcionais).
E, finalmente, chega-se ao ponto fundamental: quais são as funções
sociais exercidas pelo subsistema constituído pelos meios de
comunicação de massa?
8.2 – A teoria funcionalista da comunicação de massas
Para C. Wright Mills, as relações complexas entre os meios de
comunicação de massa e a sociedade podem ser inventariadas da
seguinte maneira:
O objetivo é articular, nomeadamente,
1. as funções
e 2. as disfunções
3. latentes
e 4. manifestas
das transmissões
5. Jornalísticas
6. informativas
7. culturais
8. de entretenimento
respeitantes
9. à sociedade
10. aos grupos
11. ao indivíduo
12. ao sistema cultural
(WOLF, 1999, p. 67.)
25
“O ‘inventário’ das funções relaciona-se com quatro tipos de
fenômenos comunicativos diferentes: a) a existência do
sistema global dos mass media numa sociedade; b) os tipos de
modelos específicos de comunicação ligados a cada meio de
comunicação particular (imprensa, rádio etc.); c) a ordem
institucional e organizativa em que os vários mass media
operam; d) as conseqüências que derivam do fato de a
principal atividade de comunicação se desenvolver através dos
mass media.” (WOLF, 1999, p. 67.)
8.2.1 - As funções do subsistema mass media
Para a tradição funcional-estruturalista as funções dos meios de
comunicação de massa podem ser relativas à sociedade, ou extraídas
a de partir uma análise que aborde os meios em si, independentes
da ordem institucional, da estrutura social e econômica na qual
estão inseridos ou ainda, levando-se em conta justamente a ordem
institucional e proprietária dos próprios meios:
1 - No que tange à sociedade, duas funções são consideradas:
1.1 Pode alertar os cidadãos em caso de ameaças
ou perigos imprevistos
1.2 “Fornece instrumentos para se executar certas
atividades quotidianas institucionalizadas na
sociedade, como, por exemplo, as trocas
enconômicas, etc” (WOLF, 1999, p.60).
2 - Uma análise voltada para o indivíduo e para a “mera
existência” (WOLF, 1999, p.60) dos meios, indica três funções:
2.1 - Os indivíduos e os grupos veiculados pelos
mass media ganham prestígio e projeção
social.
2.2 Aqueles que já desfrutam de uma posição
social privilegiada aumentam o seu prestígio
com o apoio dos meios de comunicação de
massa.
2.3 Reforço de normas sociais, antes mantidas
pelas relações típicas de sociedades não
massificadas, como por exemplo, as relações
face a face. Os meios de comunicação de massa
reforçam as normas sociais, “deunciando seus
desvios à opnião pública”.
3 - Análise que considera a inserção dos mass media no contexto
de uma determinada estrutura econômica e social
26
3.1 - Por serem sustentados pelas grandes
empresas exercem funções tais como a
contribuição para o conformismo social.
Lazarsfeld e Merton em Comunicação de massa,
gosto popular e ação social organizada
(ROSENBERG; BERNARD WHITE; DAVID MANNING
(Org.), 1973, p. 231-253) comentam que os
efeitos dos meios de comunicação de massa
variam de acordo com o sistema de propriedade
e de controle:
Destarte, considerar os efeitos sociais dos meios
de comunicação norte-americanos equivale a tratar,
apenas, dos efeitos desses meios enquanto empresas
de propriedade dirigidas pela motivação do lucro.
É do conhecimento geral que esta circunstância não
constitui um fator inato ao caráter tecnológico
dos meios de comunicação de massa. Na Inglaterra,
por exemplo, para não falar da União Soviética,
para quaisquer fins e objetivos, o rádio é de
propriedade do Estado, sendo controlado e
administrado pelo governo (ROSENBERG; BERNARD
WHITE; DAVID MANNING (Org.), 1973, p. 242).
Os autores comentam que na maioria dos meios
de comunicação de massa não são os receptores que
sustentam as empresas, são os anunciantes, “As
grandes empresas financiam a produção e a
distribuição dos meios de comunicação de massa.
Afinal de contas, quem paga ao flautista, em
geral, dá o tom” (ROSENBERG; BERNARD WHITE; DAVID
MANNING (Org.), 1973, p. 242).
3.2 Resistência às crítica feitas à baixa
qualidade dos produtos veiculados pelos meios
de comunicação de massa.
8.2.3 - As disfunções do subsistema mass media
Para Lazarsfeld e Merton as funções de atribuição de status e de
reiteração das normas sociais não é a tarefa mais difícil para
aqueles que comandam os meios de comunicação de massa. As
disfunções, como a disfunção narcotizante, é que tem passado
desapercebidas ou “Pelo menos não tem sido alvo de atenção
manifesta e, aparentemente, não tem sido utilizada de maneira
sistemática, para servir a determinados objetivos planejados”
(ROSENBERG; BERNARD WHITE; DAVID MANNING (Org.), 1973, p. 240).
27
Ao recorrerem, em larga medida, aos meios de comunicação de massa,
os norte-americanos podem então “acompanhar a evolução do mundo”.
Satisfeito com seu auto nível de informação, o cidadão acaba por
não perceber sua “recusa em tomar decisões e agir” (ROSENBERG;
BERNARD WHITE; DAVID MANNING (Org.), 1973, p. 241). Esta sua
relação secundária, passiva com a realidade política, acaba por
substituir uma possível postura mais ativa, ele “Acaba confundindo
conhecer os problemas do momento com fazer algo a seu respeito”.
Informado, o cidadão se sente realizado politicamente, sendo que a
realização em política jamais poderia ser reduzida à esfera da
informação. È por esta razão que os autores consideram os meios de
comunicação de massa como “narcotizantes sociais mais respeitáveis
e mais eficientes” ROSENBERG; BERNARD WHITE; DAVID MANNING (Org.),
1973, p. 241).
8.2.4 - Usos das funções e funções dos usos - a hipótese dos usos e
gratificações
Pelo que foi visto até aqui, é certo, no âmbito das teorias
administrativas (hipodérmica, empírica experimental, empírica de
campo e funcionalista) que os mass média tem seus efeitos,
provocam algo na audiência. Não é novidade então perguntar “o que
os mass media fazem às pessoas”, mas sim “o que é que as pessoas
fazem com os mass media”.
Apesar de admitir a falta de autonomia do receptor e a assimetria
da sua relação com o receptor, a tradição funcional-estruturalista
considera o destinatário como um “sujeito comunicativo a título
ineiro” (WOLF, 1999, p. 64).
28
9 – Teoria Crítica - A indústria cultural
Para Adorno e Horkheimer, a expressão “cultura de massas”
passa a idéia de uma cultura que surge espontaneamente do povo, de
uma nova forma de cultura popular. Mas na verdade, nas sociedades
onde a cultura de massas se instala, o que se observa é a
fabricação de uma cultura, ou seja, a presença de uma “industria
cultural”. A industria cultural constitui um sistema onde “a
racionalidade técnica é a racionalidade do próprio domínio”
(HORKHEIMER - ADORNO, 1947, p. 131; apud WOLF, 1999, p. 85). As
pesquisas de cunho administrativo, que se satisfaziam com
explicações e justificativas relativas aos aspectos tecnológicos,
recorrendo à coleta e à classificação de dados objetivos, não
levam em conta a sua própria participação no processo em questão.
As teorias da escola de Frankfurt, por sua vez, vêm propor uma
teoria da sociedade que se coloque criticamente em relação à
própria abordagem científica.
A industria cultural é um sistema onde cada parte do processo
tem uma interdependência do outro. Enquanto o mercado de
massas impõe a estandardização e a organização do consumo, o
gosto dos públicos exigem estereótipos e baixa qualidade. O
consumo é organizado pelo mercado a partir da estratificação
dos produtos em uma hierarquia de qualidade. Mas na verdade
nada muda de um nível para o outro desta hierarquia, a
estrutura de fundo permanece a mesma. A mudança não acontece
por que o novo é evitado como medida de segurança para a
eficácia da venda dos produtos. Ocorre então uma
estandardização, uma “normalização”, onde não existe
novidade, conflito nem mudança; nada menos antidialético que
a standardização.
9.1 O indivíduo na era da industria cultural
Na sociedade onde atua a indústria cultural o indivíduo
não tem vontade própria, ele é completamente manipulado pelos
sistemas que integram a sociedade onde vive. A industria cultural
determina previamente o que cada cidadão vai consumir, todos
permanecem ali “sentados no sofá da sala [...] comendo sua
culturinha de massa todo mês”3. Os próprios mecanismos do lazer são
uma mera continuidade e reprodução do processo de trabalho.
Enquanto o indivíduo pensa que está desligado do sistema de
produção, usufruindo do descanso merecido que o lazer lhe
propicia, ele está, na verdade, dentro ainda do mesmo sistema:
passeando pelo shopping, fazendo compras e assistindo a filmes que
têm como função mantê-lo acrítico, ele não está, de maneira alguma
desligado do sistema de produção material no qual se insere o
processo do trabalho.
3 Faço referência aqui à letra da canção de Tom Zé apresentada em sala de aula e
anexada ao matéria didático, intitulada “O pão nosso de cada dia”.
29
9.2 - A qualidade dos produtos da industria cultural
O tempo do trabalho e o tempo do lazer são, então, ambos
regidos pelo mesmo mecanismo econômico. E tal mecanismo domina tão
imperiosamente os indivíduos e o funcionamento da sociedade que os
produtos da industria cultural, filmes, programas de rádio,
jornais, refletem o modelo deste mecanismo. Ao promover o
entretenimento, ao propiciar a pura e simples descontração,
excluindo a reflexão sobre os processos de dominação e impedindo
uma ação mais crítica dos indivíduos, os produtos da industria
cultural colaboram para a manutenção da ordem social vigente.
A rapidez com que as informações são emitidas pelos
produtos da indústria cultural, os esquemas pré-fixados que não
chamam o espectador a uma reflexão mais profunda, o fato de que
“[...] Qualquer conexão lógica que exija perspicácia intelectual,
é escrupulosamente evitada” (HORKHEIMER - ADORNO, 1947, p. 148.
apud WOLF, 1999, p. 88) são aspectos destes produtos que
contribuem para a manutenção do sistema da indústria cultural.
Diferentemente dos complexos jogos narrativos dos romances
clássicos, que envolviam o espectador e provocavam nele uma
atividade mental construtiva, os esquemas pré-fixados, os modelos
de enredos das histórias do cinema, sempre repetitivos, não
requisitam do espectador nenhuma reflexão mais profunda. Ele, pelo
contrário, já sabe como irá terminar a história.
Na música clássica, a lenta introdução de esquemas parte a
parte, a repetição e o desenvolvimento da estrutura formal (das
melodias, das harmonias, do ritmo, etc) dão espaço para que o
espectador possa fazer do processo de reconhecimento das partes,
para que se constitua em um ato de verdadeira compreensão. Já na
“música ligeira” (maneira pela qual Adorno se referia ao Jazz) “A
composição ouve pelo ouvinte” (ADORNO, 1941, p. 33. apud WOLF,
1999, p. 89). Na “música ligeira” não há tempo para que se
desenvolvam os processos de reconhecimento.
O mesmo fenômeno de pouca estimulação mental, de exclusão
do espaço necessário à reflexão do autor, acontece na recepção das
imagens cinematográficas. No lugar de receber informações que
levam a uma reflexão interior, a uma interiorização, como na
leitura de um romance, o espectador do cinema apenas “[...] cede
sinais óticos inequívocos que podem ser captados com um olhar”
(ADORNO, 1954, p. 382. apud WOLF, 1999, p. 89).
9.3 - Os “efeitos” dos mass media
Na industria cultural os mass media não figuram apenas
como “a soma total das ações que descrevem ou das mensagens que
essas ações irradiam”. Não se pode avaliar simplesmente as
respostas de uma audiência às mensagens, deve se levar em conta o
fato de que estas mensagens são compostas de vários níveis de
significados, alguns mais aparentes, mais expressos, e outros
latentes, escondidos em camadas menos acessíveis à percepção
consciente. As mensagens “ocultas” acabam por ser mais importantes
30
que as mensagens mais aparentes. Esta constatação da teoria
crítica é bastante pertinente; encontramos, em grande quantidade,
nos produtos da industria cultural, exemplos deste tipo de “duplavinculação”
de mensagens.
Nas telenovelas brasileiras é muito comum a existência de
mensagens preconceituosas camufladas por outros elementos da
trama. Enredos que mostram a ascensão de pessoas pobres às classes
dominantes, com a ajuda dos membros de classes privilegiadas, são
muito comuns nas telenovelas brasileiras. Tais dispositivos, ao
mesmo tempo que emocionam profundamente e nutrem esperanças no
coração da grande maioria da audiência, que sonha com a ascensão
social, acabam por esconder um esquema monstruosamente
preconceituoso, onde o “pobre” ascende na pirâmide social graças
ao seu bom caráter e à ajuda dos “ricos”. Os pais que reencontram
os filhos, os cônjuges que perdoam as traições (atenção para o
poder do “perdão” em nossa sociedade), escondem preconceitos
regionais tais como o humor às custas do sotaque e dos costumes
das regiões mais pobres do país. Estes mecanismos de mensagens
embutidas, de efeitos disfarçados estavam já presentes nos
romances de folhetim ou nas primeiras radionovelas, e ainda hoje
propiciam gordas bilheterias para os empresários de Hollywood. Um
exemplo onde tal mecanismo se apresenta de maneira intensa é o
filme Independence day. A trama mal esconde a idéia de que os
Estados Unidos são o governo do mundo com histórias de famílias
separadas, de pessoas comuns e “fracassados” impressionando a
autoridade máxima do país e a opinião pública ao ajudarem a
“salvar o mundo”: o fabuloso técnico de TV a cabo que descobre o
vírus capaz de vencer os alienígenas; o velho bêbado,
ridicularizado pela sociedade local porque contava uma história
sobre ter sido seqüestrado pelos extraterrestres, e que acaba por
salvar o planeta em um suicídio heróico. Tudo levando o espectador
a ter esperança em si e no “dia da independência”.
Wolf salienta então que as pesquisas administrativas não
levavam em conta esta estrutura multiestratificada dos meios
de comunicação de massas, e tratam a complexidade das “[...]
relações manifestas e latentes entre os diversos níveis das
mensagens” como sendo causais e privadas de finalidade. Este
é um ponto capital de distinção entre a teoria crítica e as
teorias administrativas. As “relações manifestas e latentes
entre os diversos níveis das mensagens” (WOLF, 1999, p. 90)
acabam por gerar a
Tendência para canalizar a reação do
público, o que ombreia com a suspeita
largamente partilhada, ainda que difícil de
confirmar com dados exactos, de que,
actualmente, a maioria dos espectáculos
televisivos visa a produção ou, pelo menos, a
reprodução de muita mediocridade, de inércia
intelectual e de credulidade que parecem
adequar-se aos credos totalitários, mesmo que a
mensagem explícita e visível dos espectadores
31
possa ser antitotalitária (ADORNO, 1954, p.
385. apud WOLF, 1999, p. 90).
E, conforme muito bem coloca Wolf,
A manipulação do público - perseguida e
conseguida pela indústria cultural entendida
como forma de domínio das sociedades altamente
desenvolvidas - passa assim para o meio
televisivo, mediante efeitos que se põem em
prática nos níveis latentes das mensagens.
Estas fingem dizer uma coisa e dizem outra,
fingem ser frívolas mas, ao situarem-se para
além do conhecimento do público, reforçam o seu
estado de servidão. Através do material que
observa, o observador é continuamente colocado,
sem o saber, na situação de absorver ordens,
indicações, proibições (WOLF, 1999, p. 91).
9.4 - Os gêneros
A divisão dos produtos cinematográficos e televisivos em
gêneros (hoje corporificada nas estantes das vídeo-locadoras)
predefine os modelos de atitude do espectador, limita as
possibilidades de reflexão sobre os possíveis conteúdos dos
produtos em questão. O espectador que se dispõe a assistir a uma
comédia ou a um drama tem já boa parte do que seria o processo de
percepção da obra pré-estabelecido, mesmo antes do seu encontro
com a própria obra.
Apesar dos estereótipos constituírem um aspecto
fundamental da economia mental, e de seu uso ser extremamente
importante nos processos de aprendizado, a estereotipização dos
produtos culturais acaba por transformá-los em um “conjunto de
protocolos” (Wolf, 1999, p.92).
Quanto mais os estereótipos se espalham e se fortalecem,
mais a experiência dos indivíduos é reduzida. Levados a enfocar um
produto cultural pelo prisma limitativo dos estereótipos, os
indivíduos são privados da diversidade potencial da experiência e
acabam cada vez mais afeitos às idéias preconcebidas, cada vez
menos de capazes de uma reflexão autônoma e crítica.
10. Teoria crítica versus teoria administrativa
De acordo com a leitura da teoria, a pesquisa administrativa,
limitando-se à pesquisa das condições presentes, considerando como
um dado natural a contradição entre indivíduo e sociedade, que na
verdade é um produto histórico da divisão de classes, acabaria se
curvando ao monopólio da industria cultural. Os dados empíricos
colhidos nas pesquisas, originados de uma inquisição direta dos
indivíduos - ou melhor, dos “pseudo-indivíduos” - não é suficiente.
32
Para a teoria crítica faz-se necessário enquadrar estes dados
empíricos em uma compreensão da sociedade como um todo,
considerando suas ligações com a dinâmica histórica (como por
exemplo o fator histórico logo acima citado, onde a contradição
entre indivíduo e sociedade figura como um produto da divisão de
classes).
Afinal, se a industria cultural anula toda a individualidade,
se o que prevalece é um pseudo-individualismo que acaba por
mascarar uma aceitação dos valores impostos, como seria possível
dar credibilidade, e considerar como eixo da pesquisa, justamente
as opniões destes pseudo-invíduos? A ausência da autoreflexão no
empirismo administrativo, de qualquer consideração sobre os seus
próprios pressupostos e métodos, acaba por impedir que se enxergue
a estrutura da indústria cultural, onde os meios de comunicação
figurão como “instrumentos de reprodução de massa que, na
liberdade aparente dos indivíduos, reproduzem as relações de força
do aparelho econômico e social” (WOLF, 1995, p. 84). A pesquisa
administrativa acaba por considerar os indivíduos como
[...] instrumentos utilizados para atingir
determinados objetivos: vender mercadorias, elevar o nível
intelectual da população ou melhorar a sua compreensão das
políticas governamentais. Seja como for, a pesquisa tem por
função tornar o instrumento comunicativo mais compreensível e
conhecido para quem o quiser utilizar para uma finalidade
específica, de modo a facilitar o seu uso (Lazarsfeld, 1941, 2
apud WOLF, 1995, p. 84).
11. A teoria culturológica
Enquanto a teoria crítica ia ganhando espaço junto a pesquisadores
que não se identificavam com a pesquisa administrativa, surge, na
França, a tradição culturológica de estudos da cultura de massa.
As perguntas feitas por esta tradição são relativas à presença, no
panorama cultural como um todo, da cultura de massas. Como ela vem
se integrar às culturas já existentes (a cultura nacional, a
cultura humanista e a cultura religiosa):
[...] a cultura de massa é uma cultura: ela constitui
um corpo de símbolos, mitos e imagens concernentes à vida
prática e à vida imaginária, um sistema de projeções e de
identificações específicas. Ela se acrescenta, à cultura
nacional, à cultura humanista, à cultura religiosa, e entra em
concorrência com estas culturas (MORIN, 1967, p. 18).
33
Dentro deste panorama “policultural” a cultua de massas
tanto interfere nas culturas já existentes quanto é por elas
contida, e “A esse título ela não é absolutamente autônoma: ela
pode embeber-se de cultura nacional, religiosa ou humanista e, por
sua vez, ela embebe as culturas nacional, religiosa e humanista”
(MORIN, 1967, p. 18). Para Morin, as abordagens voltadas para a
comunicação de massa impedem a compreensão desta complexidade da
“cultura de massa”. Já em 1960, dois anos antes da publicação da
primeira edição de O espírito do tempo, Morin defendia a idéia de
que a cultura de massa, enquanto um conjunto de cultura,
civilização e história, somente poderia ser abordada pelo método
da totalidade (WOLF, 1995, p. 90).
Mas o que seria a cultura para Morin? No início do curso,
lançamos mão da definição de cultura por ele apresentada em O
espírito do tempo.
Podemos adiantar que uma cultura constitui um corpo
complexo de normas, símbolos, mitos e imagens que penetram o
indivíduo em sua intimidade, estruturam os instintos, orientam
as emoções. Esta penetração se efetua segundo trocas mentais de
projeção e identificação polarizadas nos símbolos, mitos e
imagens da cultura como nas personalidades míticas ou reais que
encarnam os valores (os ancestrais, os heróis, os deuses). Uma
cultura fornece pontos de apoio imaginários à vida prática,
pontos de apoio práticos à vida imaginária; ela alimenta o ser
semi-real, semi-imaginário, que cada um secreta no interior de
si (sua alma), o ser semi-real, semi-imaginário que cada um
secreta no exterior de si no qual se envolve (sua personalidade)
(MORIN, 1967, p. 17).
E é neste jogo entre real e imaginário que, por meio de
processos de identificação e projeção, onde entram em ação os
arquétipos da estrutura imaginária, que a industria cultural
encontra o desafio de superar a contradição “entre suas estrutura
burocráticas-padronizadas e a originalidade (individualidade e
novidade) do produto que ela deve fornecer” (MORIN, 1962, p.28).
34
Então, na indústria cultural, a burocracia se opõe à invenção da
mesma maneira que o padrão (o estandardizado) se opõe à
individualidade
O imaginário se estrutura segundo arquétipos:
existem figurinos-modelo do espírito humano que ordenam os
sonhos e, particularmente, os sonhos racionalizados que
são os temas míticos ou romanescos. Regras, convenções,
gêneros artísticos impõem estruturas exteriores às obras,
enquanto situações tipo e personagens-tipo lhes fornecem
as estruturas internas. A análise estrutural nos mostra
que se pode reduzir os mitos a estruturas matemáticas.
Ora, toda estrutura constante pode se conciliar com a
norma industrial. A industria cultural persegue a
demonstração à sua maneira, padronizando os grandes temas
romanescos, fazendo cliches dos arquétipos em
esteriótipos.
Praticamente fabricam-se romances sentimentais em
cadeia, a partir de certos modelos tornados conscientes e
racionalizados. Também o coração pode ser posto em
conserva.
Depois de ler um texto tão impressionante como o de Morin,
é interessante nos lembrarmos de alguns trechos da canção Parque
Industrial, de Tom Zé: “Tem garotas propaganda/ aeromoças e
ternura no cartaz/ basta olhar para a parede/ que minha alegria
num instante se refaz/ pois temos o sorriso engarrafado/ já vem
pronto e tabelado, é somente requentar e usar”4. Realmente, como
disse Morin, nos primeiros anos desta mesma década (a década de
60) logo no início de O espírito do tempo, assiste-se a uma
segunda industrialização, diferente daquela que aconteceu no
início do século XX:
A Segunda colonização penetra na grande reserva
que é a alma humana [...] A Segunda industrialização, que
passa a ser a industrialização do espírito, a Segunda
colonização, que passa a dizer respeito à alma progridem
no decorrer do século XX. Através delas, opera-se esse
progresso ininterrupto da técnica, não mais unicamente
votado à organização exterior, mas penetrando no domínio
interior do homem e ai derramando mercadorias culturais.
[...] Essas novas mercadorias são as mais humanas de
todas, pois vendem a varejo, os ectoplasmas de humanidade,
4 Esta canção consta do LP Tropicália ou Panis et Circencis, lançado em 1968. Mas
também pode ser encontrada no LP Grande liquidação de Tom Zé, do mesmo ano.
35
os amores e os medos romanceados, os fatos variados do
coração e da alma (MORIN, 1962, p. 15-16).
Ilustrativo e interessante ainda será notar como nesta
produção da tropicália a industria cultural e a cultura de massa
estavam sendo abordadas em alto nível. De acordo com Ismail Xavier
Neste momento, passamos de uma arte pedagógicoconscientizadora
para espetáculos provocativos que se
apoiavam em estratégias de agressão e colagens pop que
marcavam a politização no Brasil, de protocolos de criação
que, na origem (USA), tinham outro sentido. A ironia dos
artistas privilegia a sociedade de consumo como alvo, num
momento em que, no Brasil, há uma nova forma de entender a
questão da industria cultural e o novo patamar de
mercantilização da arte, da informação e do comportamento
jovem, incluída a rebeldia. [...] Em sua montagem de
signos extraídos de contextos opostos, o Tropicalismo
promoveu o retorno do modernismo de Oswald de Andrade e
combateu uma mística nacional de raízes, propondo uma
dinâmica cultural feita de incorporação do Outro, da
mistura de textos, linguagens, tradições. No cinema
moderno brasileiro tal mistura é a tônica de cineastas
como Joaquim Pedro, a partir de Macunaíma, Sganzerla, Ivan
Cardoso, Arthur Omar e Julio Bressane, cuja obra é feita
de invenções-traduções que convocam um amplíssimo
repertório.
A cultura brasileira do final dos anos
60, digamos pós-Terra em transe, representou a
perda de inocência diante da sociedade de
consumo, e mobilizou o dinamismo do próprio
mercado para tentar uma radicalização de seu
poder dissolvente do lado patriarcal, da coisa
de família, da tradição nacional (XAVIER, 1997,
p. 54-55).
Em outro lugar Ismail Xavier coloca também que:
As canções da Tropicália escandalizaram um “nacionalismo
cioso de purismos artesanais da sonoridade brasileira; por
outro lado, conseguiu, por certo tempo, manter um teor
subversivo dentro da engrenagem do mercado através de uma
reinvenção acelerada na composição das canções e nos seus
modos de apresentação. O AI 5, decretado em dezembro de
68, interrompeu o fluxo dessa experiência de desconcertos.
Enquanto pôde durar, esse processo singular sustentado em
plena TV foi o laboratório de uma nova articulação de
cultura e política, experiência-limite de perda de
inocência diante da industria cultural.
No seu jogo de contaminações - o
nacional/estrangeiro, alto/baixo, vanguarda/kitsch - o
Tropicalismo pôs a nu o seu próprio mecanismo. Ou seja,
chamou a atenção para o momento estrutural das
36
composições, lembrando um tipo de efeito de estranhamento
que ganha maior nitidez nas artes visuais e de mise-enscène;
as que, não por acaso, tiveram um papel fundamental
para o impacto das canções (XAVIER, 1993, p. 20 – 21).
É certo que tal procedimento de evocar com tanta ênfase
a tropicália, em uma abordagem das teorias da
comunicação, da a impressão de um desvio excessivo. Não
obstante iremos insistir e, desta forma, demonstrar a
pertinência de tal estratégia. A estratégia estéticopolítica
da tropicália constituiu, em múltiplas
instâncias, uma crítica prática e um uso singular da
industria cultural e da cultura de massas. Olhando o
comentário a seguir, vemos nas palavras de Carlos
Calado uma demonstração, um dos exemplos possíveis,
diante de muitos outros que não evocaremos, de como
esta operação direta nas vísceras da cultura foi
profícua e nos ilustra tão bem alguns aspectos da
teoria culturológica (e da teoria crítica também):
Em Parque Industrial, alternou [calado refere-se ao
maestro Rogério Duprat, arranjador do disco Tropicália ou
Panis et Circencis] frases do Hino Nacional Brasileiro com
um trecho do popular Jingle do analgésico Melhoral
(CALADO, 1997, p. 194).
Podemos ver neste aspecto da obra de Tom Zé, comentado
por Carlos Calado, como na ação estética da tropicália
podemos assistir, com grande clareza, ao movimento de
intersecção entre a cultura de massas e as outras
culturas, tal como apontado por Morin. A cultura
nacional, presente, nos signos musicais da canção - nas
frases melódicas do Hino Nacional Brasileiro - devora
(para evocar a metáfora antropofágica) e é devorada
pela cultura de massas que, por sua vez, está também
presentes nas frases melódicas do Jingle. A letra faz
referência a cultura industrial quando fala que “o
avanço industrial vem trazer nossa redenção”, e faz
referência também à indústria cultural, quando a
aeromoça e a ternura no cartaz figuram como “um sorriso
engarrafado”. A cultura industrial e a industria
cultural são saldadas: “o avanço industrial vem trazer
nossa redenção!”
A magnífica canção de Tom Zé nos realmente nos faz ver
como “Também o coração pode ser posto em conserva” em
uma sociedade onde “Praticamente fabricam-se romances
sentimentais em cadeia, a partir de certos modelos
tornados conscientes e racionalizados”. Logo em seguida
no texto, Morin irá observar que, nesta fabricação
norteada por arquétipos existe, simultaneamente, uma
tendência contrária, que exige a individualização:
37
Existem técnicas-padrão de individualização que consistem
em modificar o conjunto dos diferentes elementos, de modo
que se pode obter os mais variados objetos a partir de
peças-padrão de meccano.
Mas
Em determinado momento precisas-se de mais, precisa-se da
invenção. É aqui que a produção não chega a abafar a
criação, que a burocracia é obrigada a procurar a
invenção, que o padrão se detém para ser aperfeiçoado pela
originalidade.
Para Morin, não é possível haver uma integração total
da criação em um sistema de produção industrial. O que
acontece, no final das contas é que a industria
cultural deve estar, a cada momento, superando
constantemente “uma contradição fundamental entre suas
estruturas burocráticas-padronizadas e a originalidade
(individualidade e novidade) do produto que ela deve
fornecer” (MORIN, 1967, p. 28). A industria cultural,
para Morin, “opera a partir desses dois pares
antitéticos: burocracia-invenção padrãoindividualidade”
(MORIN, 1967, p. 29).
A contradição ai enunciada é o que explica como podem
coexistir, na indústria cultural “esse universo imenso
estereotipado no filme, na canção, no jornalismo, no
rádio, e, por outro lado, essa invenção perpétua no
cinema, na canção, no jornalismo, no rádio, essa zona
de criação e de talento no seio do conformismo
padronizado”(MORIN, 1967, p. 31).
E Morin, ainda hoje, mantém tal posição no que tange à
necessidade da originalidade na indústria cultural.
Podemos constatar isto em um texto intitulado Uma
mundialização plural, escrito neste ano de 2003 para um
livro, organizado por Dênis de Moraes, que foi lançado
no Forum mundial realizado em Porto Alegre:
Como eu expliquei em L’esprit du temps (Livre de Poche,
Essais, nova edição 1983), não se pode produzir em série
filmes ou canções idênticas, cada um deve ter sua
singularidade e sua originalidade, e a produção faz
necessariamente apela à criação. Muitas vezes a produção
asfixia a criação, mas acontece de ela permitir obrasprimas;
a arte do cinema floresceu por todo lado, em todos
os continentes, e tornou-se uma arte mundializada,
preservando, ao mesmo tempo, as originalidades dos
artistas e das culturas...” (MORIN, 2003, p. 352).
Quando se trata de arte e pensamento, para Morin, a
mundialização cultural não é homogeneizante,
“constituem-se grandes ondas transculturais que
38
favorecem a expressão das originalidades nacionais em
seu seio” (MORIN, 2003, p. 352). Já em O espírito do
tempo - não é demais lembrar que esta obra foi
publicada em 1962 - Morin falava de mundialização,
fenômeno que hoje nomeamos Globalização. No capítulo
intitulado A cultura planetária ele nos fala de como,
no terceiro mundo “não são as transformações econômicas
que, principalmente o progresso industrial, que
transformam as mentalidades” (MORIN, 2003, p. 352). No
terceiro mundo a industria cultural atua sobre as
mentalidades antes mesmo de acontecer qualquer
transformação socio-econômica. É como diz Ismail
Xavier, “No imaginário da história, passamos, portanto,
do centro à periferia, sem ter na prática jamais saído
desta” (XAVIER, 1993, p. 09).
Em Cultura hibridas Nestor Garcia Canclini nos fala
sobre a coexistência, na américa latina, do “culto”, do
“popular” e do “massivo” dentro de um sistema
contraditório e anacrônico, onde, em um mesmo espaçotempo,
temos o arcaico (pré-moderno, presente em
aspectos como o baixo índice de alfabetização), o
moderno e o pós moderno. O que Canclini chama de culto
pode-se aproximar, grosso modo, do que Morin chamava de
cultura humanística; enquanto, aquilo que Canclini
nomea como massivo, pode estar associado em alguma
medida ao que Morin chama de cultura de massas; e
finalmente, o popular tem afinidades com a cultura
nacional na acepção que Morin dá ao termo. Tal ligação
entre as teorias de Morin e de Canclini pode nos trazer
para uma reflexão sobre os meios de comunicação de
massa na realidade da américa latina. As constantes
referências aos estudos de Ismail Xavier e aos
prodígios estético-políticos da tropicália também
preparam terreno para uma abordagem dos mass media no
terreno nacional brasileiro. Mas dentro de nossa linha
de preparação para concurso, não podemos nos afastar
muito do que vai no livro de Mário Wolf. Sendo assim,
passaremos então um rápido olhar sobre a tendência dos
estudos das comunicações de massas que se deram no
interior da tradição dos estudos culturais, onde
reencontraremos conceitos apontados na introdução deste
curso, tais como os de texto, dialogismo e contexto tal
como formulados por Mikhail Bakhtin. Mas uma vez com os
pés afundados nos estudos culturais, estaremos
novamente em condição de retornar a questão do Brasil
no contexto da problemática da industria cultural, da
cultura de massas e dos meios de comunicação de massas.
39
12. Os estudos culturais
De acordo com Douglas Kellner, em A cultura das mídias,
podemos observar notáveis semelhanças entre a abordagem
da teoria crítica e a dos estudos culturais - pois
ambas “desenvolvem modelos teóricos do relacionamento
entre a economia, o Estado, a sociedade, a cultura e a
vida diária, dependendo, pois, das problemáticas da
teoria social contemporânea” (KELLNER, 2001, P. 49).
Mas os estudos culturais irão subverter a distinção
entre cultura superior e inferior, tão cara a teoria
crítica. Nos trabalhos dos estudos culturais as
produções culturais que se valem das novas tecnologias
e que se situam no seio da cultura de massas, tais como
o cinema, a televisão e a música popular, serão
valorizadas. Kellner, evocando Aronowitz, observa que
os estudos culturais acabam por tomar uma postura
oposta a da escola de Frankfurt, quando, no final das
contas, deixam de fora a cultura superior (o culto em
Canclini, a cultura humanística em Morin, grosso modo).
É o mesmo preconceito às avessas: enquanto a teoria
crítica rejeita a chamada cultura inferior (a “nova”
cultura popular, que na verdade é uma indústria
cultural na percepção dos Frankfurtinianos), os estudos
culturais rejeitam a cultura erudita, ou cultura
superior, ou o simplesmente o “culto”, para usar mais
uma vez a terminologia de canclini.
Uma questão central na tradição dos estudos culturais é
a da identidade, que vem sendo largamente discutida na
teoria social. A tônica é o declínio das velhas
identidades, antes responsáveis pela estabilização do
mundo social. O fim das velhas identidades provoca o
surgimento de novas identidades que promovem a
fragmentação do indivíduo moderno. Assiste-se a morte
do sujeito unificado, tal como formulado pela tradição
metafísica ocidental, assiste-se a uma “crise de
identidade”. Os parâmetros que antes davam estabilidade
para o sujeito na sociedade, instituições como a
família, a religião, os sentimentos de territorialidade
e nacionalidade, são deslocados, deixando os indivíduos
sem referenciais fixos.
Stuart Hall, que é o autor mais lido dos estudos
culturais, em A identidade cultural na pós-modernidade,
propõe, para os propósitos deste trabalho, três
concepções diferentes de identidade:
a) sujeito do Iluminismo -
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O sujeito do Iluminismo estava baseado numa concepção da
pessoa humana como um indivíduo totalmente centrado,
unificado, dotado das capacidades de razão, de consciência
e de ação, cujo “centro” consistia num núcleo interior,
que emergia pela primeira vez quando o sujeito nascia e
coma ele se desenvolvia, ainda que permanecendo
essencialmente o mesmo - o contínuo ou ‘idêntico’ a ele -
ao longo da existência do indivíduo. O centro essencial do
eu era a identidade de uma pessoa. Direi mais sobre isto
em seguida, mas pode-se ver que essa uma concepção muito
‘individualista’ do sujeito e de sua identidade (na
verdade, a identidade dele: já que o sujeito do Iluminismo
era usualmente descrito como masculino).
b) sujeito sociológico
A noção de sujeito sociológico refletia crescente
complexidade do mundo moderno e a consciência do que este
núcleo interior do sujeito não era autônomo e autosuficiente,
mas era formado na relação com “outras pessoas
importantes para ele”, que mediavam para o sujeito os
valores, sentidos, e símbolos - a cultura - dos mundos que
ele/ela habitava. G.H. Mead, C.H. Cooley e os
interacionistas simbólicos são as figuras-chave na
sociologia que elaboram esta concepção “interativa” da
identidade e do eu. De acordo com essa visão, que se
tornou a concepção sociológica clássica da questão, a
identidade é formada na “interação” entre o eu e a
sociedade. O sujeito ainda tem um núcleo ou essência
interior que é o “eu real”, mas este é formado e
modificado num diálogo contínuo com os mundos culturais
“exteriores” e as identidades que esses mundos oferecem.
A identidade nessa concepção sociológica, preenche o
espaço entre o “interior” e o “exterior” - entre o mundo
pessoal e o mundo público. O fato de que projetamos a “nós
próprios” nessas identidades culturais, ao mesmo tempo que
internalizamos seus significados e valores, tornando-os
“parte de nós”, contribui para alinhar nossos sentimentos
subjetivos com os lugares objetivos que ocupamos no mundo
social e cultural.
A identidade liga o sujeito à estrutura e “estabiliza
tanto os sujeitos quanto os mundos culturais que eles
habitam, tornando ambos reciprocamente mais unificados e
predizíveis.
c) sujeito pós-moderno - Mas, de acordo com Hall, o que se
argumenta hoje é que o sujeito, que nos dois modelos
anteriores tinha uma identidade unificada e estável,
está se tornando fragmentado, composto por várias
41
identidades, algumas até conflitantes ou mal
resolvidas.
Para os estudos culturais cultura é
o conjunto complexo e diferenciado de significações
relativas aos vários setores da vida dos grupos sociais e
das sociedades e por eles historicamente produzidas (as
linguagens, a literatura, as artes, o cinema, a TV, o
sistema de crenças, a filosofia, os sentidos dados às
diferentes ações humanas, sejam estas relacionadas à
economia, à medicina, às práticas jurídicas, e assim por
diante) (FISCHER, 2001, p. 25).
E, tendo em vista tal concepção de cultura, os estudos
culturais concentram seu interesse na questão da
atribuição de sentido à realidade. O que forma sentidos
na sociedade? Esta é a questão. Logo, fica fácil
entender o interesse dos estudos culturais pela mídia,
enquanto grande formadora de sentidos que é. Wolf
comenta então que
Os culturais estudies atribuem à cultura um papel que
não é meramente reflexivo ou residual no que respeita às
determinações da esfera econômica: uma sociologia das
comunicações de massa adequada, deve, pois, ter como
objetivo expor a dialética que se instaura entre o
sistema social, a continuidade, e as transformações do
sistema cultural, o controle social. As estruturas e os
processos pelos quais as instituições das comunicações
de massa mantêm e reproduzem a estabilidade social e
cultural, devem ser estudados: isso não acontece de uma
estática, mas adaptando-se continuamente às pressões, às
contradições que emergem da sociedade englobando-as e
integrando-as no próprio sistema cultural.
42
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